Brasília entrou em minha vida como o risco de uma aposta de um jogo de azar: de maneira calculada, mas sem a certeza de qualquer coisa concreta. Planejei – muito tempo antes – estar aqui, mas vim parar num momento em que não imaginava.
Inegavelmente, Brasília entrou forte em minha vida.
De todos os lugares em que já morei, Brasília foi o primeiro que me possibilitou o maior contato comigo mesmo [pra não dizer solidão] que nenhum outro foi capaz. Isso não foi uma coisa [necessariamente] ruim. Aprendi [sem demagogia] que ser forte não é corresponder ao que os outros esperam de nós, mas sim superar nossas próprias limitações, medos e, sobretudo, verdades relegadas a um segundo plano. Neste caso, Plano Piloto!
Antes dos 20 anos, todas as situações que passavam em minha cabeça não tinham mais de 2 anos. Hoje, facilmente me lembro de coisas que passam [na soma das datas] da casa dos dois dígitos.
Hoje meu irmão me ligou duas vezes. Na primeira, queria saber o que eu queria falar com ele ontem. Na segunda vez, trocamos ideias sobre o presente que daremos à nossa mãe no dia das mães. Quase que como pecado, essa segunda ligação eu atendi dentro de um auditório com cerca de 200 pessoas que assistiam a uma palestra. Eu trabalhava. Tinha que escrever uma matéria sobre o assunto. Foram 5 minutos de ligação que me abstraíram da discussão importante que havia ali.
De qualquer maneira, falar com meu irmão naquele momento foi prazeroso. Até os sintomas da minha sinusite diminuíram. Combinamos, então, voltar juntos para casa. Residências separadas pela distância correspondente a duas estações de metrô.
Foi a primeira vez em 13 anos que andamos juntos de transporte coletivo [era isso que eu queria dizer com o 4º parágrafo!]. E me lembrei, com isso, de que nossas vidas de união fraternal sofreram um corte de tempo. Pouco depois ele se mudou para Brasília. No dia de sua partida, eu não consegui chegar do trabalho a tempo de levá-lo à rodoviária, dar um abraço e dizer o quanto eu o amava. Não queiram saber o quanto isso dói.
Por isso que estar com ele hoje foi tão especial. Fui recebido com um abraço apertado e um beijo na bochecha [nossa família não se importa em demonstrar afeto]. Em menos de 50 minutos conversamos sobre muitas coisas: consulta média, insatisfação com o trabalho, parentes distantes, viagens, férias. E, diferentemente da última vez em que andamos juntos de transporte coletivo, não brigamos. Porque naquela época meu irmão era um adolescente que achava todo mundo chato. E eu era, de fato, o chato que ele achava.
Nesses últimos 13 anos muita coisa mudou. O Gu tem seu próprio carro agora [o motivo dele estar a pé hoje foi porque a esposa dele voltou mais cedo – com o carro – pra casa]. Eu continuo durango e à pé! Mas se teve algo importante que se manteve foi o meu olhar seguindo suas costas ao sair da estação, como quem deseja ter um pouco daquela segurança e paz de espírito.
Brasília trouxe meu irmão de volta.
Agora eu sei que saudade é só uma noite mal dormida...