sábado, 4 de julho de 2009

Herdeiro de uma riqueza não palpável

Hoje acordei com o peito vazio. Deve ser saudade da metade do meu coração que deixei com meu pai e minha mãe.

Como todo ser humano, só depois que a gente perde a companhia diária dos pais é que começamos a perceber o quanto isso é determinante pra gente manter o brilho nos olhos que todo mundo acha que é coragem, mas, no fundo, é a certeza do amparo do pai e da mãe que mantém aceso isso.

E o pior é que a gente nunca consegue retribuir como deve ou como quer. Sempre falta alguma coisa. Falar é tão complicado...

Mas a memória nunca esquece.

Lembro da minha mãe exigindo que eu e meu irmão tirássemos 10 em todas as provas da escola. Meu irmão sempre teve a melhor cabeça da família. Tirar 10 pra ele, naquela época, era tão fácil como eu surrá-lo na sinuca hoje em dia. Por conta da minha incapacidade de estudar, sempre me contentei com os 9.5 das provas. Na primeira vez que consegui um 10, minha mãe disse “você deveria ter tirado 11”! Lógico que na época eu fiquei inconformado, mas hoje entendo perfeitamente o que ela queria me dizer com aquilo. E foi assim que minha mãe me fez perceber que dedicação é mais do que aquilo que você espera de você mesmo – tem a ver também com o que o mundo espera da gente. Cada um tem a opção de ser grande, pequeno ou medíocre. Dependendo do que escolhemos, é da mesma maneira que o mundo vai tratar a gente.

Do meu pai lembro sempre da sua atitude altruísta. A vida inteira ele fez tudo o que podia pelos filhos. Foram poucas as vezes que apanhei dele – e minha mãe morre de ciúmes disso! Pra falar a verdade só lembro de ter apanhado do meu pai uma única vez. E lembro também da maior surra moral que ele me deu. Não me lembro o motivo, mas num certo dia minha mãe dedurou alguma arte que fiz. Meu pai me chamou no quarto e pediu pra que eu explicasse a minha versão da história. Terminei de contar a novela na mesma hora em que ele tirava o cinto. Pensei “phodeu!”, mas o que ele disse foi “eu não vou te bater, mas nunca mais quero que isso se repita”. Enrolou o cinto, guardou na gaveta e foi tomar banho. De lá pra cá, foram muitas as vezes em que levei bronca dos dois, mas nunca pelo mesmo motivo. Isso por conta de dois fatos – necessariamente nessa mesma ordem: primeiro porque me senti importante, aos cinco anos de idade, ao saber que meu pai, um adulto, se interessava em saber a versão de uma criança; segundo porque não apanhar naquele dia me mostrou que a vida sempre tem muitas opções e saídas para qualquer problema.

A verdade é que certas coisas a gente nunca aprende, se acostuma ou se conforma. Se existe algo que nunca vou conseguir é lidar com essa distância geográfica que me separa do abraço de meu pai e do beijo de minha mãe.

Saudade é unidade de medida,
Amor é a ciência exata da vida.