Pra mim, música boa é aquela que desperta algum tipo de sentimento. É a letra capaz de só fazer sentido com a melodia certa. É a canção que, a cada variação de nota musical, cutuca um pouco o peito.
Sem arte a vida é muito chata. Senti isso [senti, e não aprendi] desde pequeno.
Os shows de Paul McCartney no Brasil me fizeram lembrar que a primeira música dos Beatles que aprendi a tocar no violão foi Imagine, aos 12 anos de idade. Mas foi a música Blackbird que mexeu comigo de verdade.
Na época eu nem sabia [e ainda não aprendi] falar inglês. Quase um ano depois de escutar a música pela primeira vez e aprender a tocá-la no violão tive interesse em traduzir a letra. A tradução só não fez a música perder seu brilho porque eu prestei mais atenção no que a música queria dizer do que no que estava escrito. E ainda hoje essa canção faz sentido pra mim, 14 anos depois...
[...]
Take these broken wings and learn to fly Take these sunken eyes and learn to see…
Roberta foi a primeira mulher – descontando a minha mãe – com quem morei. Juntos fazíamos refeições, limpeza do apartamento, compras, pagamentos de contas e, às vezes, íamos juntos para a cama.
Esta última atividade era uma das minhas favoritas. Não, senhores leitores, não se trata de sacanagem. Trata-se de intimidade, na qual o sexo não estava presente pelo simples fato de sermos, Roberta e eu, amigos.
Para mim, Roberta passou a ser Tuca quando ela recebeu o apelido, de um colega nosso, de Tonica. Achei que o diminutivo amenizaria o impacto. Depois da primeira semana pronunciando Tuca percebi que o apelido carinhoso conseguia traduzir com melhor efeito a minha ternura por aquela nova amiga. Amiga mesmo, de verdade, com “A” maiúsculo.
Juntos, passamos muitas coisas. Tuca presenciou minhas piores crises, inclusive financeiras, salvas quando, no limite de escolher entre andar de metrô ou almoçar, meu pai emprestava uma grana que me salvava de uma fome lascada em Brasília.
Foi também por sua causa que, nos dias em que a tristeza batia no peito, eu respirava fundo inúmeras vezes e trocava a garrafa de conhaque – permanentemente guardada ao lado da minha cama – por uma boa conversa reconfortante.
Apesar de todo amor que tenho por meu irmão – e de quem sempre escondi as necessidades que passava/passo no Planalto Central – foi a presença de Tuca que segurou minha onda em Brasília. Era o exemplo dela que me fazia sentir vergonha quando batia a vontade de desistir de tudo.
E foi descobrindo os pedaços de seu coração, com o sentimento mais fraternal que possa existir entre uma amizade sincera, que percebi o quanto as pessoas podem ser maravilhosas quando esperamos delas apenas respeito e afeto.
Assim como eu, Tuca teve uma penca de obstáculos que a transformaram. Seu olhar carrega a sensatez que, hora ou outra, se passa por alegria. Na verdade, acho que é a paz renovada de quem sabe que a verdadeira essência da felicidade está no detalhe das coisas, no improviso da vida.
Longe de ser a princesa do conto de fadas [não por falta de beleza, mas pela ausência de ingenuidade] ou estereotipo de qualquer coisa, Tuca é linda. É alguém que tem um futuro lindo pela frente. É o meu Norte no Planalto Central e minha irmãzona. É humana.
Tuca é o presente que amenizou a pancada que Brasília representou nos meus primeiros meses de vida adulta. Seu aniversário é um feriado quase santo que comemoro praticamente como sendo meu.
Feliz aniversário, Tuca...
[...]
O vídeo é um pequeno presente. Lembranças de quando - quase acreditando que a fase ruim de nossas vidas não passaria - assistimos a apresentação deste poema de Oswaldo Montenegro. Sensação reconfortante, quase como o abraço protetor de um familiar...
Mais que uma ideia Grandiosa ou singela Como a vida iluminada Pela chama de uma vela
Mais que o pecado De um beijo bem roubado Ou abraço apertado E uma flor da primavera
Mais do que dinheiro Que a beleza no espelho Que sucesso o ano inteiro E a estrada em linha reta
Quero a liberdade Sem medida ou maldade O amor de minha vida E o calor do corpo dela
Quero a projeção da vida em arte abstrata O amor na garrafa e o copo na mão A efervescência do amor que dilata Marina em minha veia como injeção
Mais que o mistério O horror a cemitério A distância entre hemisférios A sabedoria da idade
Mais que o compromisso A ser cobrado ou assumido O achado e o perdido Uma versão e a verdade
Mais que a esperança Entre o pedido e a cobrança A esmola ou a herança O caminho e o atalho
Quero ter direito Ao seu amor o ano inteiro Ao natal em fevereiro À segurança em seu abraço
Quero um caminho que me leve a você Com atalho de sobra, sem tempo a perder A tradução do melhor que eu sinto é Marina O futuro tem gosto da sua boca na minha
***
Sentimento que brota nos olhos Desejo que escapa pela boca...